Estupro e Aborto - Semana da (não violência contra a) Mulher


Olá, mamães e papais!
Chegamos hoje ao nosso último post da série “Semana da (não violência contra a) Mulher” e não temos dúvidas de que hoje abordaremos o tema mais polêmico de todos: estupro e aborto.

Além do tema estar em voga (o que é ótimo, já que incentiva a discussão), o que motivou a escolha do tópico de hoje foi um relato de um grupo de mães no WhatsApp. Gostaríamos que vocês lessem cada pedacinho dessa história para discutirmos melhor sobre o assunto. Foi pedido autorização para publicarmos o relato, porém a identidade da vítima foi preservada, por isso vamos chamá-la de Marcela. O relato foi coletado através de conversa entre as participantes do grupo.

“Meu bebê veio como um presente pra mim, mesmo não sendo concedido com amor como deve ser. Antes tivesse sido uma gravidez de um relacionamento mal sucedido, mas não foi assim. Comigo ocorreu o que não desejo a ninguém, sofri um abuso sexual. Foi doloroso demais tudo até aqui. Mas amo meu filho, ele é somente meu, e toda vez que olho para ele, eu vejo a esperança de poder mudar toda essa dor sofrida em amor. Eu nunca me imaginei com um bebê. Hoje eu consigo ter humor, mas passei por muitas consultas com psicólogos. Eu tentei reverter todo esse tabu pra mostrar que pessoas que passam por situações como essas podem reverter todo sofrimento. Às vezes guardamos para si um assunto como esse e só dói mais ainda. Minha família me deu apoio e tudo mais, recorri a justiça para ter meus direitos de interromper a gravidez. Posso parecer uma pessoa terrível por ter quisto fazer isso, mas eu senti terror só de pensar que um bebê feito da maneira que foi feito vir a ser meu. Depois pensei: poxa, esse bebê não tem culpa, ele é simplesmente um anjo. Eu quis (abortar), mas não pude por estar com 5 meses e alguns dias. (...) eu não tinha barriga alguma e menstruava, então por isso nunca notei, mas até então não tinha contado a minha família (sobre o estupro). Contei depois que fiz um teste de gravidez por sentir algo mexendo na minha barriga.”

Sobre como aconteceu, responde:
“Eu não vi, não era parente nem nada. Eu sempre pedalava, fazia trilha e tudo, mas nesse dia eu fui pro pedal só, fiz 8km por aqui mesmo e peguei uma rua escura e um carro me seguiu, mudei de marcha para voar, mas ele me fechou e aconteceu.”

Por fim, Marcela finalizou com essa frase:
“Preciso me sentir forte pra não cair na depressão porque sempre fui reprimida e tímida.”

Sabe o que dói? Saber que não é só a Marcela que passou por isso.
Um estudo de 2011 do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) divulgou que 7% dos estupros resultam em gravidez, porém apenas 32,6% das mulheres grávidas em decorrência de estupro no mesmo ano tiveram acesso ao serviço de aborto legal. (Sinan) Parece pouco? Pois não é. São cometidos mais de 45 mil estupros por ano no Brasil, ou seja, mais de 3 mil vítimas engravidam.



Antes de falarmos mais detalhadamente, devemos deixar claro que existem dois tipos de aborto: O provocado/intencional, que é quando a gestante provoca o aborto e o espontâneo, que ocorre quando o corpo repele o feto, podendo ser provocado por diversos motivos. Falaremos aqui do primeiro caso.

A prática do aborto no Brasil é ilegal, mas aceita que alguns casos específicos sejam permitidos como:
1. Quando a gestação oferece risco de vida a mãe;
2. Em caso de estupro;
3. Caso seja detectada que a criança é anencéfala.

A prática do aborto provocado é crime (com exceção dos itens acima) segundo o Código Penal no artigo 124, que prevê pena de até 3 anos, sendo ele praticado pela gestante ou com seu consentimento. Mesmo assim, não são todos os casos que conseguem autorização da justiça, como foi o caso da Marcela, que descobriu “tarde demais”.

Mas por que será que esse número de abortos legais é tão baixo?

Talvez a resposta não esteja somente no fato do processo legal ser falho ou demorado, mas sim na questão do estado psicológico que essas mulheres se encontram. Uma mulher que passa por tal experiência se sente humilhada e passa por um turbilhão de sentimentos. É difícil assumirem para si próprias que foram violentadas, quem dirá então ir até a Delegacia da Mulher e tornar isso público?!
Infelizmente, isso se dá por dois motivos, que geralmente são vergonha/medo (principalmente quando o abusador é conhecido) ou falta de crença na justiça/achar que denunciar não adiantará em nada (realmente a delegacia da mulher ainda não é o que se espera que seja).

Segundo os dados do governo, a taxa de internações hospitalares por aborto são de 206.270 por ano, sendo que apenas 25% deste número corresponde a abortos provocados. Quantas destas internações correspondem a vítimas de estupros que preferiram fazer isso clandestinamente para não acabar se expondo ao julgamento da família ou da sociedade no geral? A mesma pesquisa aponta que não há justificativa para que a legalização do aborto diminua a taxa de mortalidade de gestantes, o que é totalmente irracional, já que as condições hospitalares e a assistência médica assegurariam a saúde da mulher.

Quantas mortes poderiam ser evitadas por mulheres que fazem práticas de aborto caseira ou se submetem a clinicas clandestinas e morrem durante o ato cirúrgico?

Vamos pensar juntos!

Se coloque na posição de Marcela (e outras milhares de mulheres) que todo ano se sentem forçadas a escolher entre dar a luz a uma criança indesejada ou procurar métodos ilegais, como medicamentos abortivos ou clínicas clandestinas. Marcela ainda foi MUITO forte e resolveu que deveria encarar o ocorrido da melhor maneira possível, mas não devemos obrigar a todas as mulheres que sejam iguais a ela ou passem pela mesma experiência. Abortar ou não deve ser uma escolha da mulher e não do Estado (ou da sociedade).

Não é mais humano deixar que a mulher possa escolher ser mãe ou não através do seu livre arbítrio? É o seu corpo e a sua mente que irão passar pelas mais diversas transformações da gestação, um processo que é bem diferente do que se passa na televisão durante os comercias de fraldas e afins. Imagine agora uma mulher passará por tudo isso contra a sua vontade.

A verdade é que o aborto já existe. A discussão não deve ser sobre ser a favor ou contra ele. O que devemos levar em consideração é se tornar legal ou não, pois é essa ilegalidade que faz com que milhares de mulheres morram todo ano. É por isso que esse é um assunto tão importante a ser debatido. O aborto ser ilegal não mantém o feto salvo, mas coloca a mãe em risco.


Esperamos gerar uma reflexão com esse texto. É um assunto delicado e polêmico, mas merece nossa atenção.

Um abraço a todos,
Verônica e Vitor

__________________________
Esperamos que vocês tenham gostado da nossa Semana da (não violência contra a) Mulher e que tenhamos tirado muitas dúvidas através de nossos posts.
Para acessar os outros conteúdos, clique abaixo:
Violência psicológica | Violência obstétrica | Amamentação pós-parto | A importância da doula 
Compartilhar no Google Plus

Escrito por Verônica Ponce

0 comentários:

Postar um comentário