Hoje é o Dia Internacional da Mulher, mas aqui não tem nada de comemoração. Esse post é sobre um assunto muito sério ainda: a violência contra a mulher. Abaixo segue meu relato vivido há quase 2 anos, quando pari meu primeiro filho. É longo e cheio de detalhes, mas sinto que eu precisava expôr o que acontece para que outras mães e gestantes entendam a situação.
Esse é o segundo post da série “Semana da (não violência contra a) Mulher”.
Confira os outros aqui: Violência Psicológica | Amamentação Pós-Parto | O que é Doula?
Logo quando engravidei pela primeira vez, fiz o que toda mulher que descobre a gravidez faz: entra na internet e faz mil e uma buscas na tentativa de saber tudo sobre o corpo humano, gestação, bebês e maternidade. Foram 41 semanas de pura busca pelo conhecimento. Sempre tive vontade de ter parto normal e, após tantas pesquisas, percebi que não queria apenas um parto normal, queria um parto humanizado.
Para mim, esse número ainda é baixo, pois certamente é apenas referente às parturientes que informaram. E as que se calaram como eu fiz?
Mas afinal, o que é um parto humanizado?
O parto humanizado nada mais é que um processo (não é um tipo, como “normal” ou “cesárea”). É uma forma de respeitar o corpo humano, sua fisiologia e entender o processo de parto para cada mulher. Parto humanizado é respeitar a vontade de conceber da mãe. Isso não significa necessariamente que a presença de médicos é dispensável, mas que estes estarão a par das decisões da gestante e respeitaram as mesmas.Quanto mais eu pesquisava, mais eu percebia que o que eu queria era muito difícil de conseguir. Logo na primeira consulta com o ginecologista obstétrico, já sentia que ele não fazia o perfil de médico “humanista”, mas sim o de “cesarista”. Insisti para a minha família que queria um parto humanizado, em casa, com banheira… não tive apoio de nenhum lado. Para uma gestante, não ter apoio dos familiares é praticamente como fechar um portão, pois contamos com a sensibilidade das pessoas próximas. E assim foi: Não fiz o parto com o ginecologista que me acompanhou (afinal, eu já sabia que cairia na faca), mas sim com o plantonista do hospital (escolhi um que tinha banheira, pelo menos uma parte do meu desejo foi realizada).
Infelizmente, muitos direitos meus foram negligenciados. A começar na internação. O primeiro passo foi me despir e deixar com que uma assistente de enfermagem raspasse todos os meus pelos. Não gostei e não me senti bem, mas não relutei. Após isso, fiquei um bom tempo sozinha até arrumarem a sala para que eu pudesse ser internada. Foi cerca de uma hora e meia até eu receber alguma companhia. Me introduziram penicilina na veia, pois eu não havia realizado o exame de streptococcus B (de nada adiantou acompanhamento e tantos meses de pesquisa nesse momento…), o que me incomodava e ardia bastante o pulso. Fiquei poucas horas na banheira com água quente, pois “era necessário” fazer o acompanhamento com cardiotoco e inserir serotonina sintética também na veia.
Não me permitiram comer e nem beber desde o momento da internação. Lembro que, enquanto estive na banheira, molhava os dedos na água e os lambia a fim de matar a sede que eu tanto tinha. Eu, que sempre sonhei em ter o parto humanizado e sem intervenções, naquele momento mudei de ideia. Pedi uma anestesia. E não foi à toa! A quantidade de serotonina sintética inserida na veia gera dores muito superiores a do nosso corpo, ou seja, não estamos preparadas para aguentar contrações tão intensas. Eu sempre fui muito forte para dores, mas com certeza consegui assustar a todos naquele corredor com meus gritos. Tomei a anestesia e fiquei mais calma, afinal, já não sentia mais nada das pernas para baixo, nem mesmo conseguia mexê-las. Estouraram minha bolsa sem nem me consultarem… e eu só descobri mais de uma hora depois! Vinham de tempos em tempos fazer o toque para saber a evolução do parto, até que a médica plantonista (super simpática, só que não) falou: “Se não nascer até às 17h, vai ser cesárea”.
Comecei a trabalhar que nem maluca… o Vitor, ao meu lado, me ajudava a cada contração que vinha e eu fazia a maior força do mundo. Já haviam me tirado muito, não deixaria que me colocassem em uma cirurgia desnecessária. Pois bem: depois de muita força e trabalho em equipe, o Lorenzo nasceu às 16h55 (chupa, plantonista!!!), mas a história não parou por aí. Para que o bebê “nascesse”, foi realizada a episiotomia (o famoso “corte na vagina”), mesmo eu implorando para que não fizessem. Após o bebê nascer, a costura doeu… e eu fui ignorada ao dizer que estava sentindo ela ser realizada. Sempre que lembro desse dia, dois sentimentos vem à minha cabeça: o da felicidade que tive ao ter meu filho e o de quanto me senti (e sinto ainda hoje) frustrada com o desrespeito que tive.
Somente HOJE, depois de quase 2 anos do acontecimento, é que percebi que foi realizada a Manobra de Kristeller, aquela que a médica ou enfermeira praticamente sobe na barriga da mãe e empurra o bebê para baixo na tentativa de "facilitar" a saída do bebê. Na hora é tanto stress e correria que você não percebe o quão violentos estão sendo com você.
Eu realmente queria que eu fosse a primeira pessoa a segurá-lo, não por “ser a primeira”, mas pelo toque tão importante que é o da mãe com um recém-nascido. O que aconteceu? Levou cinco minutos para que me entregassem meu filho. Pior: Depois de apenas 10 minutos já o levaram para tomar banho de luz, o que também não me consultaram, mas era “norma do hospital”. Nesse momento, além de levarem meu filho, também fiquei sem acompanhamento, pois as regras eram de que eu precisava descansar. Fiquei duas horas sem ninguém, sozinha, no escuro, sem nada. Foi horrível e eu não tinham nem mesmo alguém para conversar.
Levaram meu filho para mim na tentativa de amamentar. Finalmente!!! Ele não quis e o levaram embora… Até que me levaram para o quarto e minutos depois meu filho chegou. Aí, sim, tudo passou. Eu estava com o bem mais precioso da minha vida, então tudo que havia passado realmente havia passado. Fora a coceira horrorosa que eu tive por cerca de 3 dias, o que foi considerado normal pelo hospital, pois é uma reação à anestesia que tomei. O pior de tudo isso é acreditarmos que, no fim, valeu a pena. Afinal das contas, conseguimos o que tanto queríamos: nosso bebê. Aquele que amamos por quase um ano (no caso das tentantes, mais que um ano) e que finalmente chegou.
Vamos pensar de novo:
Será que realmente era pra ser assim?
O que eu lamento é não ter sido a única e nem mesmo a que mais sofreu. Lamento mais ainda que outras pessoas passem por violência ainda maior, como os casos que citarei abaixo que são recentes:1. O pai que não pôde entrar para acompanhar a namorada e perdeu o nascimento da filha, mesmo apresentando a lei no hospital;
2. Esse relato de uma estudante de medicina que participou do parto de uma garota de 16 anos que foi submetida à diversos tipos de violência;
3. Essa matéria sobre a violência obstétrica que saiu na TV que conta com várias gestantes relatando seus sofrimentos.
Gestantes, aqui fica uma lista de itens que você PRECISA saber! Garanta seus direitos, exija-os. Os médicos e hospitais fazem a festa pois sabem que a maioria das pessoas não sabem seus direitos, então eles acreditam que não devem respeitá-los.
1. Ter acompanhante é lei!
Você tem direito a acompanhante desde o primeiro até o último minuto! Nenhum hospital pode proibir o acompanhante. Ter um acompanhante é direito seu e é lei desde 2005.
2. Negar atendimento
A equipe não pode se negar ou deixar de oferecer algum alívio para a dor, assim como não podem negar atendimento à paciente;
3. Agressões verbais ou físicas
É violência qualquer tipo de agressão verbal ou física por parte de qualquer profissional envolvido no processo;
4. Manobras desnecessárias
Manobras de parto desnecessárias são violência, como a famosa Manobra de Kristeller (a técnica de subir na barriga da mamãe para empurrar o bebê e "facilitar" sua saída), que ainda é comumente realizada é AGRESSÃO e pode causa falta de oxigenação no bebê. É uma manobra de alto risco;
5. Tricotomia
Raspagem de pelos, o que aumenta a chance de infecções.
6. Lavagem intestinal
Sem necessidade.
7. Ruptura da bolsa
As contrações aumentam, assim como a possibilidade de infecção.
8. Proibir a mulher de escolher a posição para o parto
A parturiente deve se sentir confortável para parir. Não permitir que a mesma o faça da maneira que preferir é lamentável. Há diversos casos de mulheres que foram amarradas para que não se movessem.
9. Episiotomia
Corte do períneo que é realizado rotineiramente em diversos hospitais com a também premissa de "facilitar" a saída do bebê. Outro item desnecessário!
10. Ocitocina sintética
Também rotineiramente utilizada para acelerar o parto, gerando contrações mais doloridas do que a mulher deveria sentir.
11. Cesárea sem necessidade
Muitos médicos ainda empurram a cesárea como melhor opção, sendo que esta só deveria ser realizada em caráter emergencial, quando bebê realmente está passando por sofrimento. Infelizmente não é o que ocorre. Por ser uma cirurgia, há riscos.
12. Afastamento
Afastar mãe e filho após o nascimento é desumano. Também é praticado em diversas maternidades.
13. Sem comida e sem água
Imagine que um trabalho de parto dura entre 8 e 12 horas (podendo ser mais ou menos tempo que isso). Você realmente acha que é saudável ficar esse tempo todo sem comer durante um esforço tão grande do corpo?
Meninas, vamos buscar conhecimento. Somente através dele que podemos mudar a situação como está! Não aceitem o que lhes é imposto. Já li muita gente falando “é assim que as coisas são”, mas não devemos abaixar a cabeça e aceitar. Nós temos direitos e eles devem ser cumpridos pelos profissionais de saúde. Muita gente espera que esse seja o dia mais feliz de suas vidas e acaba passando por um verdadeiro pesadelo.
Vamos mudar essa realidade! Conto com vocês para distribuir informações. Envie esse texto para uma amiga gestante. Vamos criar uma corrente do bem. Só assim chegaremos ao ponto de podermos parir da forma que quisermos. Chega de violência contra a mulher!!!
Um super beijo para você que chegou até aqui!
Verônica Ponce
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